quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

A ISTÓRIA DE MOLEQUE SACY


A HISTÓRIA DO MOLEQUE SACY.
Conto de Honorato Ribeiro dos Santos.

Capítulo um.

Padre Silva, um padre jovem muito inteligente, servidor, da ala dos padres progressistas, atuou brilhantemente e realizou um trabalho autêntico, na comunidade, principalmente com a juventude.
Com a abertura da Igreja pós Concílio Ecumênico Vaticano II, saiu da sacristia e foi em busca das ovelhas perdidas; ensinando a todos a serem missionários e anunciar a Boa Nova como verdadeiros arautos da paz e libertação. De sandálias nos pés e vestes simples, padre Silva mostrou sua habilidade como o jovem de Assis. Na sua vocação de presbítero procurou, sem exceção, jovens de todas as camadas sociais. Fundou um grupo de teatro, um sindicato dos trabalhadores rurais, construiu salão de dar palestra, reconstruiu a igreja, construiu a casa paroquial e muitas obras foram realizadas por ele.
Nas suas homilias ele ensinava seus fieis a viverem como irmãos; tinha um dom de oratória maravilhoso.
No grupo de teatro, havia um jovem que se tornou amigo impecável do Moleque Sacy. Esse garoto era pretinho, magricela, de pouca leitura, filho de uma prostituta, que, além de sê-la era alcoólatra. O filho, o Moleque Sacy, era rejeitado por sua mãe. Não recebeu educação materna, nem afeto,  amor e carinho, não sabia o que era. A sua casa era a rua. Tornou-se um marginal e começou a roubar para sobreviver. Tornou-se um excluído pela sociedade, que o apelidou de Moleque Sacy. Todos os furtos, arrombamentos que aconteciam na cidade culpavam-no. Ele aprendeu a si defender da polícia. Era um garoto magro e alto, adolescente de apenas 17 anos de idade. Foi preso várias vezes, mas saia por razão de ser menor e cobertura de um grandalhão traficante.
Quem era o jovem seu amigo do que falei acima? Era um jovem professor de família média, que se chamava Thiago. O professor Thiago percebeu que o jovem Moleque Sacy não era mau como o povo dizia. Moleque Sacy gostaria de ter uma mãe boa, não cachaceira; um pai bom, ter um lar, uma boa educação, uma formação como um cidadão de bem; ser formado e ser gente respeitada dignamente como um ser humano. Somente o professor Thiago o compreendia. Então, o professor Thiago levou o Moleque Sacy ao padre Silva e contou-lhe toda a história e o porquê que o Moleque Sacy se tornou marginal. Teria que recuperá-lo com a ajuda do padre Silva e dele, o professor Thiago. O padre Silva o recebeu e começou a lhe mostrar outro mundo: ensinado por Jesus Cristo. Deu-lhe muitos conselhos para que ele fosse realmente um cidadão de valor: um cristão. O padre Silva sabia que era difícil a sua tarefa de recuperá-lo, pois a sociedade é hipócrita. Mas como padre, era a sua missão de servir e ensinar e abraçar os que estão no caminho errado. Assim começou a amizade com o padre Silva. Às escondidas ia sempre visitar o padre. Mas a polícia sempre estava em seu encalce. Não morava mais com a mãe, pois ela o expulsou de sua casa e o odiava. Ainda jogava praga no filho. Nenhuma autoridade tivera ideia de levá-lo para um internato, uma escola de recuperação de menor. Ninguém. Todos cantavam a canção de Chico Buarque: “Joga pedra na Geni”. (...).
Moleque Sacy só roubava; nunca esfaqueou e nem matou ninguém. Talvez roubasse para poder sobreviver. Ele aprendeu escrever e ler, pois, quando ainda garoto freqüentou a escola. Não sendo educado por sua mãe que nunca lhe dissera quem seria o pai, cresceu frustrado e o mundo só ensina coisas erradas e anti-sociais, o anti-religioso. Foi o que ele aprendeu: desassociar-se.
Moleque Sacy sabia de muitas coisas dos poderosos dos tráficos de drogas, que ficaram ricos e poderosos. Ele sabia o nome de cada um. Eles, os traficantes, também sabiam que o Moleque Sacy sabia quem eram eles, por isso. o ameaçava se abrisse a boca. Eles lhe agradavam com dinheiro e pediam para que ele não roubasse mais. Mas Moleque Sacy roubava por revolta de uma sociedade hipócrita, que só dava valor quem tem poder e dinheiro. Quando o Moleque Sacy se encontrava com o padre Silva e o professor Thiago, lhes contava tudo sobre os traficantes e a polícia.
O padre Silva construiu um salão para dar palestras e um palco para teatro. Mas Moleque Sacy não ia nesses encontros de palestras religiosas e nem ao teatro, pois era rejeitado e vigiado pela polícia. Só se encontrava com o padre e o professor às escondidas.
Um dia, a polícia foi chamada para prender o Moleque Sacy, que subiu no telhado de uma casa para roubar. A polícia chegou e começou a atirar nele. Ele, feito gato, correu por cima dos telhados de todo o quarteirão e fugiu. A polícia não o agarrou. Ele se escondeu num quintal de uma casa. Um amigo e irmão de um traficante, pegou o carro e foi dar cobertura ao Moleque Sacy. Pegou-o e o levou em seu carro e deu-lhe abrigo. A polícia soube, mas não foi em busca do Moleque Sacy. Fez de conta que não soubesse de nada.

CAPÍTULO DOIS.

AS DROGAS.

O Moleque Sacy sempre se encontrava com seus amigos: o padre Silva e o professor Thiago. O professor Thiago era muito inteligente, culto e explicava-lhe sobre a falsa sociedade e da falsa democracia. O Moleque Sacy aprendia muitas coisas com seu amigo professor: história do Brasil, a má política dos governantes, as corrupções, o tráfico de droga e dos traficantes. Moleque Sacy sabia quem era os traficantes, quem era os viciados; e sabia que a polícia também sabia, mas não prendia ninguém. Somente ele é que a polícia perseguia. Ele sonhava de um dia sair daqui e procurar outro lugar onde poderia lhe valorizar e poder arranjar um emprego e se sentir como gente. Aqui, só quem lhe entendia eram os dois amigos. O povo já estava censurando os dois por lhe darem apoio como pessoa humana. Davam-lhe conselhos, mas ele continuava revoltado e, quando ele achava uma brecha, furtava de quem era rico. Moleque Sacy aos 14 anos conviveu entre fortes traficantes, mas nunca viciou em droga e nunca cometeu crime. Todos os traficantes tinham medo de ele denunciá-los à polícia federal, pois, o professor era muito letrado e poderia ter lhe orientado como denunciar do grupo. Sabiam que o Moleque Sacy só roubava para sobreviver, pois, nem mesmo a sua mãe deixava-o  dormir, comer em sua casa. Também a coitada era alcoólatra e analfabeta e para sobreviver se prostituía.
São muitos os Moleques Sacys que vivem assim nesse país.
O craque, e a maconha entravam à reveria e havia bastantes jovens viciados; roubam para comprar drogas, mas a polícia só perseguia o Moleque Sacy. O motivo de a polícia prender o Moleque Sacy, era somente para intimidar os traficantes, pois o Moleque sabia, detalhadamente, quem era o chefão do tráfico. Mas para ficar de boca fechada, o chefão dava dinheiro para o Moleque ficar de boca calada. Também havia alguns soldados que recebiam ordens do chefão.





CAPÍTULO TRÊS.
O CONFRONTO CONTRA O DELEGADO.

Alguém foi avisar o delegado de polícia que o Moleque Sacy estava escondido na casa de um amigo e, que, naquela noite, ele tinha roubado no armazém daquele bairro. O denunciante foi a pé, pois não tinha telefone e era muito distante. Chegando lá, fez a denúncia. O delegado saiu às pressas em sua viatura, levando dois soldados com ele. A delegacia ficava bem distante do bairro, onde o denunciante dissera estar o Moleque Sacy. Quando o delegado chegou com a polícia cercaram a casa e deram voz de prisão para o Moleque Sacy se entregar. O Moleque Sacy saltou o moro. Deram vários tiros contra o Moleque. Nenhum tiro o alvejou. Ficaram em alerta com as armas em punho. O delegado estava em pé, no meio da rua, com o revólver em punho, quando sentiu alguém por detrás o agarrou, dando-lhe um golpe de mestre lutador e desarmou o delegado. O delegado tentou reagir, mas Moleque Sacy, ágil, deu-lhe uma capoeira jogando o delegado por terra e fugiu com a arma do próprio delegado, que era um sargento. Os dois soldados quando chegaram, viram, ainda o delegado no chão todo sujo de areia. Perguntaram-no o que havia acontecido e o delegado contou-lhes. Os soldados foram correndo para ver se ainda encontrariam o Moleque Sacy. Que engano! Moleque Sacy estava bem longe e armado. Mas ele não tinha o espírito de assassino, pois, se tivesse, teria matado o delegado. Nem sequer deu um tiro no delegado, na mão, por exemplo, ou o pé. Mas, não. Ele só queria mostrar que ele sabia se defender e não tinha medo da polícia e nem tampouco do delegado. Ele só tinha medo do chefão.
A rua ficou repleta de gente vendo, talvez assistindo a um filme de caw boy, sendo o mocinho o Moleque Sacy vencendo o xerife. Muitas histórias foram formando na imaginação dos que assistiram ao duelo entre o delegado e o Moleque Sacy: Davi e o gigante Golias, (...). O delegado foi ao suspeito chefão e lhe pediu que mandasse pedir ao Moleque Sacy a sua arma de volta. O Chefão mandou chamar o Moleque Sacy e ele o atendeu. Ao chegar, o chefão pediu-lhe o revólver do delegado. Ele o entregou e recebeu uma bolada. O chefão lhe pediu para não roubar mais e que ele daria uma mesada todos os meses. O Moleque respondeu: “Diga para a polícia, e esse delegadozinho de merda, que me deixe em paz”. Se continuarem a me perseguir continuarei furtando. Não é somente eu que rouba. Há muitos, aqui, que roubam, inclusive o senhor. Eu sei de tudo e de sua riqueza e poder. Sou pobre e sem família; o senhor sabe disso. Minha mãe que poderia gostar de mim, me odeia. O senhor só me dar apoio e dinheiro, porque eu sei tudo de sua vida suja.
No outro dia o delegado recebeu o revólver de volta. Mas, à noite houve uma festa da elite, no centro da cidade. Moleque Sacy foi e entrou, pois  o porteiro tinha medo dele; não o barrou. Avisaram a polícia que o Moleque Sacy estava na festa. A polícia e o delegado foram. A polícia chegou de vez e agarraram-no. Moleque Sacy, franzino que era, derribou os soldados e se escapou  em leso. Gente se espalhou por todos os cantos e a ruas encheram de gentes curiosas. Os soldados deram vários tiros na direção do Moleque Sacy, mas fugiu são e salvo. Mais uma decepção para a polícia. Moleque Sacy estava sendo herói de verdade. Os comentaram se espalharam como manchete do dia. “Moleque Sacy contra três soldados armados e o delegado, mas não o agarraram.” Tornou-se herói da pequena cidade com a penas quinze mil habitantes.
No outro dia, Moleque Sacy foi ao chefão reclamar que o combinado tinha quebrado. Ele agora iria furtar. Ficou revoltado e furioso com o chefão que lhe deu mais dinheiro.
De posse do dinheiro, que o chefão lhe dera, Moleque Sacy foi à fazenda de um amigo ficar lá uns dias, fugindo de tantas perseguições da polícia. Lá ele ficou sonhando ter uma vida digna de um cidadão. Sonhava sair daquela vida de roubar para sobreviver. Não achava ninguém que o ajudasse a sair daquela situação marginal. Pensava no amigo, professor Thiago e no padre Silva: os conselhos dos dois amigos. Por causa dele os dois eram criticados pela sociedade, que só sabia jogar pedra, mas não dava oportunidade de resgatar a vida de quem não tinha família. Sentia rejeitado pela mãe e a sociedade. Não sabia quem era seu pai biológico. Pô-lo no mundo e ficou uma pessoa marginalizada. Ele gostaria de conhecer o pai verdadeiro. Talvez ele não fosse ébrio ou ruim; pudesse aceitar como filho. Mas a imaginação de Moleque Sacy não tinha resposta. Todos os lados havia caminhos cheios de pedras; de espinhos e areia movediça. O professor Thiago contou-lhe a história de Zumbi. Zumbi, o herói dos negros africanos. Ele também era negro, mas não era herói como Zumbi, que morrera para libertar o seu povo negro. Moleque Sacy voltou para viver a mesma vida, pois não achou solução nenhuma.

CAPÍTULO QUATRO.

A JURA FOI QUEBRADA.

Quando Moleque Sacy voltou da fazenda do amigo, foi ao chefão pedir dinheiro, mas foi negado. “Não lhe darei mais dinheiro e nem apoio, pois corro perigo de a justiça descobri quem sou eu. Você continua a roubar. Pode roubar à vontade. Eu não me importo mais. E você fique calado, pois, poderá morrer.” Moleque Sacy saiu furioso com o chefão traficante e disse que iria abrir a boca. “Não abro, aqui. Abro bem longe. Sei o caminho aonde eu chegarei e o denunciarei. Vou acabar com você e seu bando”. Disse o Moleque Sacy. No outro dia a polícia prendeu o Moleque Sacy e o professor Thiago. A família do professor Thiago ficou revoltada. Não havia motivo para o prender. A polícia usou um álibi, afirmando que o professor Thiago era amigo de Moleque Sacy e dava-lhe apoio a um marginal. A família do professor contratou um advogado e esse entrou com um habeas-corpus e o soltou. Mas Moleque Sacy não precisou de advogado: foi solto, pois era menor de 17 anos. Mas o delegado estava providenciando para levar o Moleque Sacy para a FEBEM. Mas o Moleque Sacy sabia que a FEBEM não resgatava ninguém. Não há uma educação onde os menores possam ser resgatados e voltarem ser valorizados como pessoas dignamente humanas. Ele sempre fugia e não queria ir. “Educar alguém tem de amar. Nesse país ninguém ama quem é marginal.” Moleque Sacy sabia de tudo sobre essa entidade. “Seria melhor viver como vivo, mas livre. Mesmo apedrejado pela sociedade hipócrita, mas tenho liberdade de ir e vir, quando eu quiser.”
 

  CAPÍTULO CINCO.

A tarde estava linda, batia um vento fresco. O sol já estava se declinado e os pássaros cantando na copa das árvores. A cigarra cantava como sempre. Ao longe se ouvia o latido de cachorro e gorjeava o sabiá. Moleque Sacy estava sentado num tronco de árvore estendido no chão e começou a imaginar. Seu pensamento voava procurando a felicidade, que há muito tempo não sabia o que era. Começou a pensar melancolicamente: “Por que minha mãe não gosta de mim?! Quem é o meu pai? Eu não pedi a ninguém para vir ao mundo. Todo mundo tem uma família, uma casa para morar, um bom emprego... Há destino? Não acredito, pois, o padre Silva me ensinou que todos nós temos o direito de viver dignamente e respeitado como ser humano. O professor  disse-me que as terras do Brasil são dos índios, pois eles eram os verdadeiros donos dessa terra. Vieram os portugueses e os roubaram tudo: seus costumes, sua cultura e sua língua. Hoje os índios são até queimados, como aquele em Brasília. Milhões de índios foram mortos por não aceitar ser escravos dos brancos como os negros africanos. Os donos dessa terra hoje, os latifundiários, são os verdadeiros grileiros, pois, compraram na mão de quem? De quem era essa terra? Não era dos índios? Compraram na mão do índio? Toda riqueza, ouro, prata, diamante, etc, eram dos donos que moravam aqui há milhões de anos. Se voltarmos até os primeiros habitantes da terra, foi dado pelo criador gratuitamente. Inventaram os cartórios, as leis e registraram como se fosse deles. Agora, compraram na mão de quem? Isso tudo o professor Thiago me ensinava a verdadeira história que não é contada nas escolas e faculdade. Mas o povo sabe que essa é a verdadeira história da humanidade.” Naquele instante foi quebrada a imaginação, o pensamento e as imagens em perspectivas na mente do Moleque Sacy, quando se ouviu dois tiros. O povo saiu à porta da rua e viu um corpo estendido no chão. Era a do Moleque Sacy. Muita gente viu, saindo do mato dois soldados armados pegando o corpo de Moleque Sacy e o puseram no carro e partiram. Levaram ao hospital. Quando o médico o assistiu disse-lhes: “Está morto”. Os soldados mandaram que o médico desse o laudo afirmando que foram prendê-lo, mas ele reagiu. “Não tivemos outro jeito, senão quem seria morto éramos nós.” Só que os tiros foram pelas costas. Mataram-no covardemente. Todo mundo sabia que o Moleque Sacy não usava arma. Quem foi o mandante do crime? O povo sabe, mas: “Cala-te, boca”. “Em boca calada não entra mosca”. “Quem conversa muito dá bom dia a cavalo”.
Agora ninguém mais teve ódio de Moleque Sacy. “Coitadinho, morreu porque era preto e pobre.” “Porque a mãe jogou praga.” “Foi a sina.” “Tem gente que nasce sem sorte.” Foi essa a conversa, o casuísmo criado sem escrúpulo nenhum. Sempre é assim a sociedade. “Morreu que Deus o tenha.”
Na lousa, o amigo Thiago mandou escrever: “Aqui, jazem os restos mortais de um garoto de 17 anos, rejeitado pela sociedade e uma mãe alcoólatra e prostituta.”

Se houver uma história que alguém conheça igual a essa, é mera coincidência.
FIM.

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